(Tese 95 – João Manô)
Quando
falamos sobre reforma é importante termos em mente o propósito de Deus para
toda sua criação, expresso desde Gênesis, ter todas as coisas convergidas para
o louvor de sua glória. Desde a queda do homem, Deus tem trabalhado para
restaurar todas as coisas, por meio de seu povo[1].
Em
toda a narrativa bíblica percebemos o desejo de Deus por relacionamento, e
vemos uma sequencia de caminhar tortuoso, quedas, reformas e reconciliações. A
narrativa do Antigo Testamento, quase que 70% dela, mostra o afastamento do
povo de Deus do propósito para o qual foram estabelecidos e os muitos homens e
mulheres, com suas vozes proféticas, que o Senhor levantou para trazer reforma
no meio de Seu povo.
E
nessas idas e vindas do povo de Israel percebemos que o coração de Deus não
mudou, Ele permanece esperando a resposta de seu povo por relacionamento e
profundidade. Também não é diferente quando olhamos para a história da Igreja, ao
observarmos seus avanços e regressos dentro do propósito de Deus. Vemos o
florescer em Atos, a unidade, a comunhão e o crescimento orgânico alinhado com
a perseguição, o martírio e amor ao Senhor e aos povos não alcançados.
Atualmente,
estamos sendo inundados por uma onda de mensagens positivas e uma estranha
falta de lágrimas nos olhos; os cultos de sábado a noite (juventude) em sua
maioria parecem mais entretenimento e um culto a si; estamos na era “coaching” e muitos de nossos irmãos tem
chegado ao estremo que Bonhoeffer[2]
chamaria de “graça barata”. Estaríamos nós, precisando de uma reforma?
Relembrando um pouco de
1500
Dia
31 de Outubro do corrente ano comemoramos 317 anos de Reforma Protestante. Essa
data é contada a partir da atitude do monge agostiniano, Martinho Lutero, que
fixou na porta da igreja do Castelo de Wittenberg, no ano de 1517, suas famosas
95 teses que versavam contra a venda de indulgências, estabelecida pelo Papa
Leão X. É de saber comum, entre os estudantes da história da Igreja, que essa
primeira reforma teve precursores como John Wycliffe[3], Huss[4],
Savanarola e entre outros nomes conhecidos, que contribuíram para o retorno às
escrituras e os fundamentos de uma salvação única e exclusivamente pela fé em
Cristo Jesus.
É
válido recordar também, outros nomes importantes que contribuíram na mesma
geração de Lutero, como Cataria Zell[5],
Elisabeth de Calenberg, Wursula Weyda, Calvino[6], Zwinglio[7], Marguerite
de Navarre[8] e
muitos outros nomes que ajudaram a trazer a bíblia de volta para a mão do povo
– tendo em vista que esse foi o principal foco da reforma de 1500.
Não
estou fechando os olhos para os pés de barro[9],
que cada um desses homens e mulheres tiveram, mas é válido considerarmos que
foram relevantes nesse período e, mesmo não sendo os definidores das famosas
“cinco solas” da reforma protestante, foram seus idealizadores.
As
cinco solas é a sintetização do credo cristão, pós reforma protestante, elas
foram estabelecidas e difundidas tempos depois de 1500 por teólogos reformados.
A Igreja Católica crê em todas elas, com exceção da palavra “sola” que no
português significa “somente”. 1) Sola Gratia – Somente a graça, favor
imerecido, é o meio pelo qual podemos ser salvos. É presente de Deus e em
nenhum momento, mérito humano; 2) Sola Escriptura – Somente a escritura
é a fonte de inspiração dada por Deus, ela é a autoridade máxima para o
cristão; 3) Solus Christus – Somente Cristo é o único mediador entre
Deus e a humanidade; 4) Soli Deo Glória – Toda a glória é devida e
tributada ao Senhor, pois somente Ele pode salvar e alcançar o coração perdido;
5) Sola Fide – É o entendimento que a justificação é somente pela fé em
Cristo Jesus que pode trazer salvação ao homem.
A
bíblia foi devolvida para mão do povo, agora todos poderiam ler e se relacionar
com Deus. As definições da salvação foram ajustadas, agora a Igreja começou a
florescer, todavia mais reformas foram necessárias para que os frutos
aparecessem. Mais reformas eram necessárias, a Igreja ainda carecia de
ferramentas que lhes foram tiradas.
John Wesley, os
Morávios e a Rua Azuza
O
século XVII foi um momento conflituoso entre irmãos. Luteranos perseguindo
anabatistas, católicos perseguindo protestantes, e no campo teológico a bíblia
transformou-se em arsenal para uma guerra doutrinária. O evangelho não era mais
o poder de Deus para a salvação. Foi dentro deste contexto que surgiu o
movimento petista entre muitos irmãos, os mais conhecidos são Wesleyano e
Moraviano.
Os
morávios foram refugiados recebidos pelo conde Nicolau Von Zinzendorf em sua
fazenda na Bavária, durante uma época de perseguição. Eram irmãos de diferentes
movimentos protestantes, com seus conflitos e diferenças internas, que precisaram
viver em comunidade. Foi através de uma vida de devoção ao Senhor e constante
oração coletiva que o Espírito de Deus soprou algo novo dentro dessa comunidade
e abençoou povos de diferentes culturas. Esses irmãos sustentaram uma rotina de
oração coletiva por 100 anos, e foram os primeiros a enviarem missionários para
locais distantes da Europa. Muitos de seus missionários se venderam como
escravos para ganhar escravos para Jesus. Foi através deles que conhecemos a
seguinte frase: Que o Cordeiro receba a
recompensa do seu sofrimento, através de mim.
Dentro
ainda, desse contexto de conflitos entre movimentos institucionais, surge, no
século XVIII, John Wesley e o metodismo. Na região da Inglaterra e a Igreja
Anglicana (oficial do Estado), a família Wesley foi instrumento de Deus para
trazer de volta o fogo interior de busca e devoção pelo Espírito Santo, por
meio das disciplinas espirituais. Pessoas que não eram recebidas nos prédios
das igrejas, agora ouviam o evangelho por meio da pregação itinerante. Essa foi
uma das principais marcas do ministério de Jhon Wesley. É válido ressaltar que
o ministério e conversão de John Wesley teve forte influência do movimento
moraviano.
Percebemos
aqui Deus trabalhando e restaurando sua Igreja, devolvendo a ela as ferramentas
necessárias para o fim dos tempos. Em 1500 vimos a devolução da bíblia e o
ministério de Mestre sendo restaurado. Entre 1600 a 1700 a oração e o
ministério do Evangelista, voltam ao seu lugar. E o mover de Deus continua se
espalhando, da Europa para a América – consequência, também, da contra Reforma.
As missões modernas se intensificam, e surgem os avivalistas no início do
século XIX, como também o Movimento de Restauração com os irmãos Campbell,
Stone e Walter Scott. A ênfase desse movimento era unidade do corpo de Cristo e
o retorno aos princípios da Igreja primitiva, seu lema era: Não somos os únicos cristãos, mas
simplesmente cristãos. / Nos essenciais unidade, nas opiniões liberdade, mas em
todas as coisas o amor.
Em
1905, surgem nos Estados Unidos reuniões pentecostais e um dos atingidos por
esse ministério é Willian Seymour, um pregador negro, que impactou sua geração
através da Missão da Rua Azuza. A mensagem de Seymour era que o batismo do
Espírito Santo não era apenas para santificação, mas para evidencia – o falar
em outras línguas, o profetizar e os demais dons citados em Atos e Coríntios. O
movimento pentecostal se espalhou por diversas regiões da América Latina,
África, Ásia e Oceania.
É
válido ressaltar que a ênfase não era simplesmente os dons, mas a santidade e a
oração. No livro “A Igreja do século XX”, lançado pela editora Impacto, mostra
claramente que todo movimento de oração e restauração desemboca em missões e
amor pelos povos não alcançados.
Em nossos dias
Antes
desse breve resumo da história da Igreja, lancei a pergunta: será que estamos
precisando de uma reforma? E minha resposta é a seguinte, olhemos para o que
Deus fez na geração dos nossos antepassados. Cavemos os poços que foram cavados
por aqueles que vieram antes de nós[10].
Temos bons exemplos em nossa geração de irmãos que tem feito isso, e mesmo em
meio à superficialidade e à graça barata, temos visto o movimento de oração sendo
restaurando, o ministério profético sendo reestabelecido e entendido de forma
mais clara, à luz das escrituras.
Quando
estudamos a história da Igreja vemos o Espírito de Deus restaurando e trazendo
de volta o que foi perdido. Falamos muito sobre retornar à Igreja de Atos, e
esse é de fato o desejo de Deus, mas precisamos lembrar que a leveza, o agir do
Espírito e as conversões são acompanhadas de martírio e perseguição. A Igreja
do fim dos tempos é uma Igreja que estará preparada para o martírio e a
perseguição. Não foi atoa que Jesus afirmou, citando os profetas:
Não
está escrito: A minha casa será chamada, por todas as nações, casa de oração?
(Marcos
11:17)
Também
os levarei ao meu santo monte, e os alegrarei na minha casa de oração; os seus
holocaustos e os seus sacrifícios serão aceitos no meu altar; porque a minha
casa será chamada casa de oração para todos os povos.
(Isaías
56:7)
Deus
está ensinando sua noiva a orar. A oração nos prepara para o martírio, para os
povos que ainda não o conhecem[11].
A oração nos ensina a clamar: Maranata! O livro de Apocalipse é um manual de
oração para o fim dos tempos. A grande tribulação será um tempo em que a Igreja
irá orar como nunca orou antes.
[1]
Israel e a Igreja.
[2]
Dietrich Bonhoeffer, teólogo e pastor luterano, membro da resistência
anti-nazista na Alemanha hitleriana.
[3] O
primeiro a traduzir a bíblia para o Inglês. Foi chamado de a estrela D’alva da
reforma.
[4]
Johm Huss, monge e professor universitário alemão. Morreu dizendo: “Hoje vocês
estão matando o ganso, mas daqui 100 anos virá o cisne, o qual vocês não
conseguirão matar!”. Seu nome: “Huss” significa ganso; sua fala fazia
referencia a Martinho Lutero, o cisne.
[5] As
mulheres na Reforma Protestante: https://www.luteranos.com.br/textos/500-anos-de-reforma-protestante-e-as-mulheres#:~:text=Sabemos%20de%20mulheres%20da%20nobreza%20que%20se%20empenharam,entre%201491%20e%201495%20e%20faleceu%20ap%C3%B3s%201543%29.
[6]
Principal nome da reforma protestante na região de Genebra. Seu fundamento
teológico e prática pública tiveram grande repercussão em muitas gerações, e
até os dias de hoje inspira a prática cristã na esfera pública.
[7] Principal
líder da reforma na Suíça.
[8]
Vozes femininas na Reforma – Rute Salvino.
[9]
Expressão usada como referência aos defeitos da pessoa.
[10] E tornou Isaque e cavou os poços de água que
cavaram nos dias de Abraão seu pai, e que os filisteus entulharam depois da
morte de Abraão, e chamou-os pelos nomes que os chamara seu pai. (Gênesis 26:18)
[11]
Segundo os missiólogos a última fronteira hoje, dos não alcançados, é o mundo
mulçumano.