Transforma quem
eu sou por dentro
Domar os
sentimentos que não vem de Ti
Transborda quem
eu sou por dentro
E molda os meus
afetos e desejos mais profundos
Eu quero te
querer ainda mais
Eu quero te
querer ainda
Me ensine a te
querer ainda mais
(Marcelo Sissá e
João Manô – Você é aquilo que ama)
Quando
nos deparamos com as escrituras e os requisitos do discipulado de Jesus,
podemos pensar: como são altas essas “exigências”! É muito difícil ser
discípulo de Jesus! Será que consigo viver a boa, agradável e perfeita vontade
de Deus para minha vida? Quando olhamos para nós mesmo e nos deparamos com os
tropeços diários nossa resposta sempre será negativa, e viveremos sempre com o
real e o ideal – como sou e como deveria ser.
Todavia,
percebemos em toda a história bíblica que o mesmo Deus que estabelece o padrão,
nos auxilia, por meio Dele, a forma de alcançarmos esse padrão. É Ele quem cria
em nós um Espírito inabalável capaz de resistir as mais violentas tempestades.
É Ele quem nos dá o livramento nos momentos de tentação. É Ele quem nos ensina
a amá-Lo acima de todos os outros amores. E esse último ponto é o cerne de
todas as coisas. As afeições do nosso coração diz quem somos e para onde
estamos indo.
Já
escrevi isso em outros texto aqui, e provavelmente você deve ter lido ou ouvido
outras pessoas falarem a mesma coisa, pois no final das contas é o que a Bíblia
nos ensina: O nosso Deus é um Deus relacional! Ele nos criou para essa
finalidade, viver em comunidade. Fazer parte de Sua comunidade (a Trindade). E
é exatamente por isso que o escritor James A. Smith[1]
afirma que não somos porque pensamos, ou compramos, mas somos porque amamos.
Somos o que amamos!
O imutável amor de Deus
Sabemos quanto
Deus nos ama e confiamos em seu amor. Deus é amor, e quem permanece no
amor permanece em Deus, e Deus nele. À medida que permanecemos em Deus,
nosso amor se torna mais perfeito. Assim, teremos confiança no dia do
julgamento, pois vivemos como Jesus viveu neste mundo. Esse amor não tem medo,
pois o perfeito amor afasta todo medo. Se temos medo, é porque tememos o
castigo, e isso mostra que ainda não experimentamos plenamente o amor.
Nós amamos porque ele nos amou primeiro.
(I João 4:16-19)
João
escreve essa carta afirmando na primeira pessoa do plural: “Nós sabemos... nós
confiamos...”, verdades sobre do amor de Deus. Muitos questionam o testemunho
de João a respeito de si mesmo, principalmente no seu evangelho, por afirmar
ser: “o discípulo a quem Jesus amava...”. Alguns, por esse motivo, o consideram
prepotente ou mesmo chegam a dizer: “Mas, esse João se acha eih!”. Mas, a
verdade contida no ensino de João é simplesmente: Confie no caráter de Deus. O
Deus que servimos é imutável, e o amor é a própria pessoa Dele. Se o amor é Sua
essência e se Sua essência é imutável, podemos ter plena confiança de que o
amor Dele por nós não muda! Essa é a razão da certeza e da confiança.
João
nos ensina a tirar o foco de nós. A questão do amor não é o quanto O amamos,
mas o quanto Ele nos ama. Enquanto os olhos do nosso coração não forem abertos
para essa verdade, viveremos dia a pós dia patinando no discipulado de Jesus. É
por isso que João afirmava: “Eu sou amado!”, ele não dizia que era “o mais
amado”, ele simplesmente confiava que era amado. Por quê? Por que Deus mostrou
essa verdade por meio de Jesus. Essa foi a experiência que João teve com Jesus,
e é essa experiência que ele nos orienta a te.
O medo é sinônimo de não ter experimentado plenamente o amor. Se tememos é porque não confiamos no caráter de Deus, não confiamos que o sacrifício de Jesus foi suficiente! Paulo traz uma poesia profunda e linda a respeito desse amor do Pai por nós:
“Quem nos separará do amor de Cristo? Serão aflições ou calamidades, perseguições ou fome, miséria, perigo ou ameaça de morte? [...] E estou bem convencido de que nem morte nem vida, nem anjos nem demônios, nem o que existe hoje nem o que virá no futuro, nem poderes, nem altura nem profundidade, nada, em toda a criação, jamais poderá nos separar do amor de Deus revelado em Cristo Jesus, nosso Senhor. (Romanos 8:35 e 38-39)
Se
esses versos não são suficientes para trazer confiança, à nossa agitada alma, no
caráter de Deus, oremos ao Senhor para que os olhos dos nossos corações sejam
abertos. Usando ainda alguns versos do apóstolo Paulo, à igreja de Éfeso,
podemos concluir que o primeiro passo para crescermos no discipulado de Jesus é
estarmos fundamentados / firmados / enraizados no amor – em Sua pessoa e
caráter.
Quando penso em
tudo isso, caio de joelhos e oro ao Pai, o Criador de todas as coisas nos céus
e na terra. Peço que, da riqueza de sua glória, ele os fortaleça com poder
interior por meio de seu Espírito. Então Cristo habitará em seu coração à
medida que vocês confiarem nele. Suas raízes se aprofundarão em amor e os
manterão fortes.
(Efésios
3:14-17)
Alinhando nossos anseios e desejos
Como
afirma Smith: “...a ordem de Jesus para
que o sigamos é um chamado a alinhar nossos amores e anseios aos dele – querer
o que Deus quer, desejar o que Deus deseja, ansiar pelo que Deus anseia e
almejar por um mundo onde ele é tudo em todas as coisas.”. Nossa resposta
ao discipulado de Jesus é uma resposta de amor àquele que nos amou primeiro.
Segundo
esse mesmo autor, o amor é algo desenvolvido por meio do hábito, das nossas
liturgias diárias. Portanto, é possível dizer que aprendemos a amar. Parece
estranho dizer isso, e contrário ao que a maior parte dos filmes e séries
ensinam, mas o amor está completamente relacionado com algo (alguém) que
gastamos nossos dias aqui na terra. O amor está relacionado com nosso dinheiro,
tempo e hábitos.
O discipulado de Jesus é um convite para reordenarmos nossas afeições e desejos, posto que, estes naturalmente, em detrimento da queda, foram corrompidos e deturpados. Nosso coração e subconsciente são focados e direcionados para outros lugares. É por isso que nossos afetos e comprometimentos do coração precisam ser calibrados.
[...] se o
coração é como uma bússola, um dispositivo erótico de orientação, então
precisamos calibrar (regularmente) nosso coração, ajustando-o para que esteja
apontado para o Criador, nosso norte magnético. É crucial reconhecermos que
nossos maiores amores, anseios, desejos e paixões são aprendidos.
(James A. Smith)
Portanto,
as disciplinas espirituais ensinadas por Jesus, reavivadas na igreja por meio
do movimento metodista[2],
sistematizadas e difundidas pela obra clássica de Richard Foster, Celebração da
disciplina, são fundamentais nesse processo de reordenamento de nossos afetos.
Como também, a interação de modo consciente no culto ao Senhor, por meio dos
elementos litúrgicos – louvor, confissão de pecados, exposição das escrituras, ceia
do Senhor – são fundamentais no discipulado do nosso coração.
Dentro
das disciplinas espirituais, uma prática que tem sido propagada entre os
cristãos é o devocional, um tempo diário para meditação nas Escrituras e
oração. Um tempo a sós com o Criador. Essa prática é também niveladora no que
diz respeito aos nossos amores, ela nos conduz a contemplar a beleza de Deus e
direciona nossos afetos à Ele.
Por
mais que a tradição possa ter levado muitos de nós a entender tais meios apenas
como rituais religiosos, essas liturgias possuem significado profundo e podem
redirecionar os comprometimentos do nosso coração, de volta para Deus. O amor
do Pai por nós é o meio pelo qual podemos amá-lo de volta! E amá-lo de volta é
uma prática diária.
Conclusão
Talvez
seu Ensino Médio e Graduação tenham sido parecidos com os meus, e tentaram te
convencer de que você é aquilo que pensa ou raciocina, por causa da famosa máxima do filósofo Descartes[3]: “Penso,
logo existo!”. Talvez os Shoppings e a sociedade de consumo o convenceram que
você é aquilo que seu dinheiro pode comprar. Mas, não se engane, a Bíblia e a
prática dizem o contrário: “Você é aquilo que ama!”/ Você é aquilo que deseja!
Por
maior esforço que os racionalistas fizeram para nos convencer de que somos
racionais, cérebros em um corpo; a experiência e o indivíduo provam o
contrário. Somos seres que adoram, que veneram; seja uma ideologia de
sociedade, seja ao mercado financeiro, seja ao Deus único, seja à natureza,
enfim; nosso coração sempre estará comprometido com algum deus. Pois fomos
criados para o fascínio, fomos criados para amar!
Fizeste-nos,
Senhor, para ti, e o nosso coração anda inquieto enquanto não descansar em ti. (Agostinho
de Hipona)
[1]
Escritor do livro: Você é aquilo que ama.
[2]
Movimento Metodista, liderado pelos irmãos Wesley’s, John e Charles. Foi um
período de avivamento experimentado pela Inglaterra no século XVIII.
[3] René
Descartes foi um filósofo, físico e matemático francês. Durante a Idade
Moderna, também era conhecido por seu nome latino Renatus Cartesius.