sexta-feira, 13 de agosto de 2021

O Poder de Deus se aperfeiçoa na fraqueza

 

E disse-me: A minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza. De boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas fraquezas, para que em mim habite o poder de Cristo.

(2 Coríntios 12:9)

 

 

Algo importante que precisamos observar na narrativa bíblica é a forma como Deus trabalha na história da humanidade, usando aqueles que “não são” para cumprir seu propósito original, a restauração de todas as coisas para o louvor de Sua glória. A Bíblia possui inúmeros exemplos do poder de Deus se aperfeiçoando na fraqueza humana. O caminho da fraqueza, é o caminho pelo qual o nome do Senhor é mais glorificado, para que todo o mérito seja Dele.

Um desses exemplos fascinantes é encontrado no início do segundo livro da Bíblia, o livro de Êxodo. Duas mulheres que eram parteiras das escravas hebréias. Quando observamos a organização social daquela época, é possível percebermos que Sifrá e Puá estavam em uma posição bem inferior na pirâmide social. Elas eram as servas das escravas. Em um português mais esdrúxulo e popular, elas seriam: “O cocô do cavalo do bandido.”

 

O rei do Egito ordenou às parteiras dos hebreus, que se chamavam Sifrá e Puá: "Quando vocês ajudarem as hebréias a dar à luz, verifiquem se é menino. Se for, matem-no; se for menina, deixem-na viver".

Todavia, as parteiras temeram a Deus e não obedeceram às ordens do rei do Egito; deixaram viver os meninos. Então o rei do Egito convocou as parteiras e lhes perguntou: "Por que vocês fizeram isso? Por que deixaram viver os meninos? "

Responderam as parteiras do faraó: "As mulheres hebréias não são como as egípcias. São cheias de vigor e dão à luz antes de chegarem as parteiras".

Deus foi bondoso com as parteiras; e o povo ia se tornando ainda mais numeroso, cada vez mais forte. Visto que as parteiras temeram a Deus, ele concedeu-lhes que tivessem suas próprias famílias.

(Êxodo 1:15-21)

 

O infanticídio como meio de controle populacional não é novidade, nem mesmo nos tempos atuais. Infelizmente, essa era uma realidade praticada por muitos governos da antiguidade. Há dois relatos bíblicos de autoridades estatais que praticaram isso, Faraó (Êxodo 1) e Herodes, o Grande (Mateus 2). Esses atos de crueldade ocorreram em momentos de grande importância para a história da redenção. Aparentemente temos decisões de governos humanos, todavia, o que temos no texto é o contexto de uma guerra cósmica travada. Dentro dessa perspectiva, é visível a resistência dos poderes rebeldes contra a vontade de Deus.

Pelo que é relatado, essas mulheres, além de serem servas das servas, não pareciam ser casadas e muito menos ter filhos – ser casada e ter filhos eram requisitos imprescindíveis para que uma mulher fosse valorizada nos tempos antigos. Não ter filhos era sinônimo de maldição dos deuses. Deus usou essas mulheres, que não tinham nenhuma importância para os homens, afim de preservar seu povo, a linhagem do Messias.

Talvez você pode pensar: “Ah!! Então quer dizer que eu preciso ser pobre, e sem nenhum título ou posição social elevada para ser usado por Deus ou aprovado por Ele?” Não necessariamente. A questão aqui está no que Jesus revelou na exposição do Sermão da Montanha, em Mateus 5:3, os “pobres em espírito”. A melhor tradução para essa expressão seria: “Pobres piedosos”, aqueles que possuem Deus como seu único recurso, ante a situações de opressão e injustiça. A questão é que normalmente os corações encontrados nessa condição, de quebrantamento e humildade coincidem com pessoas socialmente desfavorecidas. Naturalmente rejeitadas e excluídas socialmente. Portanto, essas mulheres, Sifrá e Puá tinham um coração temente a Deus, mesmo vivendo na cidade dos homens[1]. Elas não tinham nenhum poder econômico ou político, a pesar disso, não mostraram nenhum sinal de intimidação com aquele decreto de morte. Essas mulheres foram usadas como canal da benção de Deus. As parteiras das escravas tiveram um papel fundamental na história da redenção.

Talvez você se questione, mas a Bíblia não diz que devemos orar pelas autoridades e honrá-las? Sim, mas há um princípio antes desse: Importa primeiro obedecer a Deus, do que aos homens. Nossa obediência total e incondicional é ao Senhor, todavia, se as leis humanas, contrariam o que foi estabelecido por Deus, podemos – nesse caso – desobedecer aos homens. Segundo Elaine Storkey, Sifrá e Puá estavam assumindo o mesmo tipo de convicção de princípios que ecoou com os mártires ao longo dos tempos.

Segundo o pastor Thimoty Keller, Deus está trabalhando para trazer justiça e salvação nos bastidores das tragédias. A salvação acontece por meio dos fracos! É assim que Deus age nas linhas da história humana. Deus chamou aquelas parteiras para agirem a partir do lugar em que estavam, é o mesmo também para nós hoje! Nosso ponto de partida sempre será a oração por discernimento, persistência e coragem. O temor a Deus levará homens e mulheres a gritarem com ousadia contra as injustiças na cidade dos homens.

 

Significados e associações

O nome Sifrá significa “lindo”;  Puá quer dizer “gritar”. Significados que coincidiram diretamente com o propósito de vida dessas duas mulheres. Parece acaso quando lemos ou pesquisamos a respeito, mas os nomes na Bíblia, em sua maioria estavam relacionados à vocação ou causa daquele personagem. Como também, as mudanças de nome são de extrema importância nas escrituras, pois revelam momentos de mudança no caráter e encontros que trouxeram profundas transformações.

No mesmo contexto que essas mulheres viviam, um tempo depois do plano de Faraó ter falhado, Deus continuou usando mulheres para preservarem o menino que mais tarde seria “O libertador” de Israel, Moisés. Do mesmo modo aconteceu com Jesus. Maria e José, dois judeus comuns, foram usados por Deus para protegerem o Filho de Deus, enquanto este era apenas um bebê. Esse casal comum, estava longe dos holofotes sociais, porque tudo isso fazia parte do propósito de Deus.

 

E, tendo eles se retirado, eis que o anjo do Senhor apareceu a José num sonho, dizendo: Levanta-te, e toma o menino e sua mãe, e foge para o Egito, e demora-te lá até que eu te diga; porque Herodes há de procurar o menino para o matar.

E, levantando-se ele, tomou o menino e sua mãe, de noite, e foi para o Egito.

E esteve lá, até à morte de Herodes [...]

Então Herodes, vendo que tinha sido iludido pelos magos, irritou-se muito, e mandou matar todos os meninos que havia em Belém, e em todos os seus contornos, de dois anos para baixo [...]

(Mateus 2:13-16)

 

A guerra cósmica, dos principados e potestades contra o cumprimento e estabelecimento da vontade de Deus na terra, é uma realidade! Esse é um dos motivos pelo qual Deus trabalha nos bastidores, cumprindo as profecias dadas a seu povo da forma que os eruditos e estudiosos menos esperam. O mistério da fraqueza está relacionada com o que falamos no início do texto, mas também está ligada a essa verdade. Jesus era o descendente de Davi, nascido em Belém, mas seus pais não faziam parte da nobreza, a linhagem do trono havia saído da família de Judá desde o exílio, e se consolidou na era pós-exílica com o domínio Macabeu – dinastia Asmoneia.

Com o domínio romano, a esperança messiânica dos judeus não estava mais no filho de Davi que viria, mas na restauração da dinastia Asmoneia. Interessante essa forma como Deus preparou todo o contexto para despistar e guardar a semente da mulher para o cumprimento de Seu propósito, não é mesmo!? É incrível ver essas múltiplas faces do mistério da fraqueza. Deus derramando graça sobre corações quebrados, movendo seus planos adiante nos bastidores do sofrimento.

 

Conclusão

Ainda restam profecias a respeito do Messias e da consumação do plano de redenção para a humanidade a serem cumpridas. A atuação de Deus será da mesma maneira, usando a fraqueza e os bastidores para o cumprimento de seu plano eterno. Deus continuará usando a perseguição e sofrimento para que Jesus encontre uma noiva madura e preparada para o casamento. Se foi assim durante toda a narrativa bíblica, porque seria diferente no que está por vir!?

Que possamos ser achados fiéis, humildes e mansos diante do Senhor. Para que a graça Dele seja derramada em nossa fraqueza, para o louvor de Sua glória!

 

 



[1] O termo “Cidade dos homens” se refere ao sistema cultural e religioso regido por princípios contrários ao Reino de Deus. A narrativa bíblica nos revela que há o paralelo de duas cidades sendo construídas ao longo da história, Babilônia e a Nova Jerusalém.

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