Falar de Reforma
Protestante é falar das várias mudanças que o mundo Ocidental sofreu. Temos um
movimento que literalmente abalou a estrutura econômica, social e religiosa de
muitos países da Europa e deram origem a novos países como a Nova Inglaterra
(Estados Unidos da América). Muitos benefícios são inegáveis e
devemos menciona-los aqui, como a invenção de Johannes Gutenberg que
revolucionou os meios de produção e distribuição de livros. A prensa de
Gutenberg foi fundamental na difusão da Bíblia no alemão e posteriormente para
outras línguas.
Outro ponto positivo
importante foi a consolidação e enriquecimento da língua alemã, por meio da
tradução da Bíblia no alemão liderada por Martinho Lutero. João Calvino teve
grande influência religiosa e política em Genebra, contribuindo para uma
valorização moral do trabalho e a prática da poupança (acúmulo de capital) como
caminho para o enriquecimento.
Além de todas essas
mudanças sociais, a Igreja precisava voltar a olhar para Jesus através das
escrituras. Sua liderança estava corrompida pela sede de poder e riquezas,
enquanto os fiéis pereciam por falta de conhecimento e compaixão. Os escritos
dos reformadores e reformadoras foram de suma importância para que houvesse luz
na escuridão que a população da época estava imergida. Escuridão esta, que o
iluminismo e o humanismo contribuíram para disseminar.
Mesmo ante a todos os
benefícios citados a cima é valido ressaltar por meio do famoso jargão popular:
“Nem tudo são flores!”. Esses mesmos santos que foram usados para trazer luz à
escuridão, também contribuíram para a disseminação do ódio e o desencadear de
muitas guerras dentro da própria cristandade. Os nossos heróis tinham pés de
barro, às vezes eram santos e outras vezes opressores[1].
Revoltas,
perseguições e Antissemitismo
A Revolta dos
camponeses na Alemanha, entre 1524-1525, é um exemplo de como os escritos de
Lutero motivaram camponeses a entrarem em guerra contra seus príncipes. A
questão é que foi um verdadeiro massacre, posto que, tratavam-se de camponeses
completamente despreparados para um confronto militar contra uma parcela rica
da população que possuíam seus próprios exércitos. A atuação de Lutero aqui foi
considerada nebulosa, tendo em vista que seus escritos pendiam para os dois
lados do conflito[2].
Outro ponto controverso
a ser ressaltado na vida desse mesmo reformador, foi mais um de seus escritos,
este concluído no final de sua vida: Sobre
os judeus e suas mentiras[3].
Essa triste obra de Lutero contém severas críticas ao judeus e infelizmente
influenciou outros teólogos[4]
que mais tarde defenderam abertamente ao nazismo. Esses eram os pés de barro do nosso tão aclamado reformador alemão. É fato que Lutero sempre trabalhou e orou pela conversão dos judeus, todavia, não há dúvidas de que essa sua obra foi um erro.
Guerras
internas e mais divisões
Como bem afirmou o
ministro Marcondes Soares, não era o intuito de Lutero que a Igreja do Senhor
Jesus Cristo se dividisse em 30 mil denominações diferentes. Não estavam nos
planos do reformador nem mesmo desligar-se da Igreja Católica Romana, mas sim
que houvessem mudanças no ensino e um retorno às escrituras.
Os anos que sucederam à
Reforma foram de muitas guerras e perseguições de católicos contra luteranos,
anglicanos contra católicos, luteranos e anglicanos contra anabatistas e assim
muitos outros tipos de disputas religiosas que se misturavam com interesses
políticos e econômicos. Noites sangrentas como a noite de São Bartolomeu,
também conhecida como o massacre dos huguenotes[5],
em 24 de agosto de 1572, que tirou a vida de mais de 5.000 pessoas. O
resultando desse massacre foi o exílio de mais de 300.000 franceses huguenotes.
Comunidades como a dos
Morávios (seguidores de John Huss), formada por irmãos que foram expulsos da
Boémia, foram exemplos de refugiados que foram recebidos em outros países e acolhidos
em propriedades como a do Conde Zinzendorf. As guerras e perseguições
religiosas perduraram por séculos.
Mulher
casada como padrão de feminilidade bíblica
Antes da Reforma
Protestante as mulheres podiam trilhar caminhos diferentes e viverem para a
glória de Deus, podiam escolher diferente e ainda assim serem consideradas
piedosas e tementes à Deus. A dra. Barr[6]
afirma:
As mulheres sempre
foram esposas e mães, mas foi a partir da Reforma Protestante que ser esposa e
mãe se tornou o “padrão ideológico de santidade” para as mulheres. Antes da
Reforma as mulheres podiam ganhar autoridade espiritual rejeitando sua
sexualidade. A virgindade lhes dava autonomia. As mulheres se tornavam freiras
e faziam votos religiosos e algumas, como Catarina de Siena e Hidegarda de
Bingen, descobriram que suas vozes ressoavam com a autoridade dos homens. Na
verdade, quanto mais distantes as mulheres medievais ficavam do estado civil de
casada, mais próximas elas ficavam de Deus. Após a Reforma, o oposto tornou-se
realidade para as mulheres protestantes. Quanto mais se identificavam como
esposas e mães, mais devotas se tornavam.
Infelizmente muitos
reformadores não incentivaram as mulheres como pregadoras, teólogas e
evangelistas, negando assim o sacerdócio universal de todos os crentes[7]. Mas,
apesar de todos esses equívocos tivemos mulheres que foram fundamentais durante
o período da Reforma Protestante, como Margarida de Navarra, Marie Dentière,
Catarina Zell e muitas outras. Mulheres que propagaram a salvação pela graça
mediante a fé, que usaram seu poder e riquezas para proteger irmãos anabatistas
e protestantes de diversas nacionalidades.
Conclusão
O que a Reforma
Protestante nos ensinou? Como também os avivamentos na história da Igreja? Que
homens e mulheres são apenas homens e mulheres, todos sujeitos a erros e
limitações. Tanto a narrativa bíblica como a história da Igreja nos reforçam
que não somos os personagens principais da história da redenção. Somos vasos de
barro que carregam a excelência do poder, que é o próprio Deus. Nossos heróis e
heroínas são e vão continuar sendo de extrema importância para o fortalecimento
de nossa fé, vamos aprender com eles, com seus erros e acertos, olhando sempre
para Cristo, o autor e consumador da nossa fé.
Pois é olhando para Ele
que nunca seremos abalados ou confundidos. É olhando para Ele que teremos a
certeza de que Ele é! Nele colocaremos nossa confiança e esperança! Não a nós, SENHOR, não a nós, mas ao teu
nome dá glória, por amor da tua misericórdia e da tua fidelidade. Por que
diriam as nações: Onde está o Deus deles? No céu está o nosso Deus e tudo faz
como lhe agrada. (Salmo 115:1)
[1]
Opressores e santos: uma análise do bem e do mal na história cristã – John Dickson,
editora Thomas Nelson Brasil, 2023.
[2] A
guerra dos camponeses: a mediação de Lutero sob discussão – Tarcísio Vanderlinde,
revista Alamedas.
[3] Tradado
escrito em 1543.
[4]
Leia mais no texto: https://mentes-renovadasmay.blogspot.com/2021/04/hegel-teologia-liberal-alema-e-os.html
[5]
Nome dado aos protestantes franceses, em sua maioria calvinistas (seguidores de
João Calvino).
[6] A
construção da feminilidade bíblica – Beth Allison Barr, Thomas Nelson Brasil.
[7]
Reformadoras – Rute Salviano.