sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

O Senhor dos Exércitos


Pelo Senhor, marchamos sim
O Seu exército, poderoso é
E Sua glória será vista em toda terra

Vamos cantar o canto da vitória
Glória Deus, vencemos a batalha
Toda arma contra nós perecerá

(Adhemar de Campos)

Ilustração do livro: A Princesa do Jardim do Grande Criador

Esse é um dos nomes de Deus que era muito usado pelos irmãos e irmãs de vertentes pentecostais, na década de 90 (minha infância). Lembro-me das músicas que cantávamos, como “O nosso general é Cristo” de Adhemar de Campos, e do entendimento que alguns líderes tinham a respeito desse “exército de Deus”, como se fosse as forças armadas de algum país. Sempre tinha algum líder que colocava a igreja para marchar e cantar alguma música de conquista e vitória.

Por mais que eu entenda que a igreja do Senhor Jesus aqui na terra, alinhada com Sua vontade e cheia do poder do Espírito Santo, seja capaz de fazer maravilhas e transformar realidades completamente destruídas pelo pecado, não a vejo como um exército armado com armas humanas, que luta por interesses terrenos e pecaminosos. Eu a vejo vestida com a verdade, que é o próprio Cristo e Sua Palavra, pronta para morrer e não para matar.

É fato que Jesus virá nas nuvens acompanhado de uma multidão de santos, mas a batalha que foi travada contra Ele, será ganha por ninguém menos que Ele e a espada afiada que sai de sua boca[1]. Os inimigos do Cordeiro são tão insignificantes em suas forças e armas que cairão, com apenas um sopro da boca de Jesus[2]. É como Davi falou[3] e o Oficina G3 cantou: “Porque do Senhor é a guerra, e o inimigo vem ao chão, na força do braço de Deus, sem espada ou canhão.”[4]

O termo “Senhor dos Exércitos / O Senhor das hostes celestiais” (Sabaoth [Σαβαὼθ /אבצ]) aparece na Bíblia pela primeira vez no livro de I Samuel, o livro da transição entre o tempo dos juízes e o período da monarquia em Israel.

 

Significado

A palavra Sabaoth, que nas traduções para o português ficou como “Exércitos”, possui diferentes significados no hebraico. Ela aparece 282 vezes em toda a Bíblia. O seu primeiro significado é serviço/servo, seja de guerra ou do Tabernáculo (o trabalho dos levitas). É por isso que no texto hebraico, o agrupamento de pessoas tanto para o serviço sacerdotal como para o serviço militar, é usada essa mesma palavra.

O segundo significado do termo são as hostes celestiais, alguns os chamam de corpos celestes. Nas escrituras veremos a palavra Sabaoth tanto para o sol, lua e estrelas, como também se referindo a principados e potestades do mundo invisível. Dentro desse significado de governantes invisíveis, também entram os que governam sobre a terra, reis, monarcas, chefes, e afins.

Portanto, o sentido militar é apenas um dos significados dessa palavra que tornou-se um dos nomes de Deus na Bíblia. Ela carrega o significado de toda a criação. Em I Samuel o Deus de Israel se apresenta, como Yahweh Sabaoth, o Deus que governa todo o Cosmo, nos céus, na terra e em baixo da terra. Aquele que tem controle sobre todas as coisas, e governa sobre todos os seres criados. Ele é o verdadeiro Rei.

 

A palavra no texto

Todos os anos esse homem (Elcana) subia de sua cidade a Siló para adorar e sacrificar ao SENHOR dos Exércitos. [...] E fez (Ana) um voto, dizendo: “Ó Senhor dos Exércitos, se tu deres atenção à humilhação de tua serva, te lembrares de mim e não te esqueceres de tua serva, mas lhe deres um filho, então eu o dedicarei ao SENHOR por todos os dias de sua vida.

(I Samuel 1:3 e 11 NVI)

O autor do livro começa a narração deixando claro que o Deus adorado em Siló, por todos os israelitas que peregrinavam de ano em ano para o dia do Yom kipur (Dia da expiação)[5], era o Deus soberano, que governava todos os seres criados. O escritor também coloca esse nome de Deus na boca de Ana, em sua oração de súplica e quebrantamento.

É importante ressaltar a carga de significado e peso que tem esse capítulo de abertura do livro de Samuel. O propósito de Deus não era uma monarquia ou o estabelecimento de um rei, como os demais povos que viviam ao redor de Israel. Ele tinha dado leis que eram suficientes para manter Israel seguro e próspero contra qualquer ameaça externa. Todavia, cada uma fazia o que lhe parecia melhor, e então se instala o ciclo de queda-arrependimento-redenção acontecendo em todo o livro de Juízes. Isso, até chegarmos no sacerdócio corrompido da casa de Eli e o nascimento da escola de profetas com Samuel.

A adoração a outros deuses, aos “Exércitos celestiais”, era algo que estava incluso no ciclo de constante queda de Israel. O povo de Deus era um povo idólatra, desde o Sinai. E eles não melhoram nesse aspecto quando entraram na terra prometida. O livro de Juízes é uma pequena amostra dessa realidade. Esse coração leviano alinhado com o pedido por um rei, foram bons motivos para que o autor do livro de Samuel começasse sua narrativa apontando para o único e verdadeiro Rei, o Senhor dos Exércitos, o Deus todo Poderoso.

 

Conclusão

A situação do povo de Deus hoje não é muito diferente do que vemos na narrativa bíblica de Juízes e Samuel. Talvez você possa pensar que é exagero, mas o nosso coração continua mal e corrupto, da mesma maneira que antes.  Somos especialistas em fabricar ídolos e destruir toda a boa criação de Deus em prol dos nossos interesses egoístas e pecaminosos. A diferença é que temos a revelação completa do Verbo de Deus, temos o Deus trino habitando em nossos corações e nos ajudando a amar e cumprir a lei do Senhor. Recebemos uma medida muita grande da revelação de Deus, e como igreja no Ocidente, temos liberdade para acessar todo tipo de conteúdo e versões da revelação de Deus. Somos indesculpáveis!

Que o nosso coração não seja obstinado demais e rebelde a ponto de sermos rejeitados, como Saul foi. Que a graça do arrependimento esteja sempre sobre nós, para que tenhamos olhos para ver quão pecadores somos e quão grave é nosso pecado. Que o Espírito Santo continue nos ensinando que o caminho de Jesus será sempre de humildade e quebrantamento. Que os monumentos que estamos construindo no decorrer da nossa existência, seja sempre para a glória do verdadeiro rei, Yahweh Sabaoth, o Senhor dos Exércitos!

 



[1] Apocalipse 19:15

[2] Isaías 11:4 e II Tessalonicenses 2:8

[3] A música escrita por Walter Lopes baseada na fala de Davi, em I Samuel 17:45-47.

[4] Música: Davi (1996 – Indiferença)

[5] Levítico 16.