sexta-feira, 12 de junho de 2020

Escatologia IV - A promessa de um Rei


Eu creio que o céu irá se abrir e o Filho do Homem virá por nós, no final desta era veremos o Rei vindo com as nuvens em sua glória.
(Maranata – Victor Vieira)


Um dos grandes problemas que tivemos no decorrer da história da Igreja é forma como a mesma interpreta e vê Israel. Muitos teólogos falam que Deus terminou com Israel, sendo que o próprio Paulo expõe e afirma o contrário[1]. Entender corretamente a forma de tratar Israel tem a ver com entender corretamente a própria Cristologia – o estudo sobre a pessoa de Cristo. O princípio exegético da revelação progressiva, dentro da narrativa bíblica nos faz visualizar com clareza o propósito de Deus desde o início. A primeira menção da promessa de um Messias na Bíblia é:

E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar. (Gn 3:15)

Está ainda obscuro aqui, mas já podemos ver os vestígios da cruz e do propósito final do Messias[2], nesse único versículo. Em outros textos, antes mesmo da aliança abraâmica podemos perceber o anseio humano por um salvador que traria refrigério e descanso. O prometido não vai apenas destruir a serpente, mas nos trará descanso das consequências do pecado. Exemplo disso é a declaração de Lameque a respeito de seu filho Noé: “Que ele nos traga alívio de nossas tarefas e trabalho doloroso de cultivar esta terra que o Senhor amaldiçoou.” (Gn 5:29)
No restante do livro de Gênesis vamos perceber de onde viria a linhagem desse rei. Seria da linhagem de Abraão, a aliança é confirmada em Isaque e na geração seguinte com Jacó. E no penúltimo capítulo de Gênesis, quando Jacó abençoa seus filhos antes de morrer, Deus revela mais um pouco a respeito desse rei messiânico, tanto em relação a linhagem como sobre sua missão. Ele será israelita da linhagem de Judá: O cetro não se afastará de Judá, nem o bastão de autoridade de seus descendentes, até que venha aquele a quem pertence, aquele que todas as nações honrarão. Ele amarra seu potro a uma videira, seu jumentinho a uma videira seleta. Lava suas roupas no vinho, suas vestes, no sangue das uvas.” (Gn 49:10-11)

Eu o vejo, mas não agora; eu o avisto, mas não de perto. Uma estrela surgirá de Jacó um cetro se levantará de Israel. Esmagará a cabeça do povo de Moabe e rachará o crânio dos descendentes de Sete. [...] De Jacó surgirá um governante que destruirá os sobreviventes do ar.
(Nm 24:17-19)

Aqui em Números, na peregrinação do povo de Israel no deserto, Balaão é contratado por Balaque para amaldiçoar Israel, mas ao invés disso esse profeta pagão profere uma das mais incríveis profecias messiânicas. A linhagem de Sete dá origem à toda humanidade existente hoje na terra, mas nesse texto está se referindo aos inimigos de Israel e consequentemente do Ungido de Deus. Aquele que vai esmagar a cabeça da serpente será um rei que governará a partir de Israel.

 “(...) O Senhor te faz saber que te fará casa.
Quando teus dias forem completos, e vieres a dormir com teus pais, então farei levantar depois de ti um dentre a tua descendência, o qual sairá das tuas entranhas, e estabelecerei o seu reino.
Este edificará uma casa ao meu nome, e confirmarei o trono do seu reino para sempre.
(...) Porém a tua casa e o teu reino serão firmados para sempre diante de mim; teu trono será firme para sempre.” (II Sm 7:11-16)

A promessa desse texto vai além de Salomão, e da construção do primeiro templo em Jerusalém; ela faz menção ao Messias que viria em duas etapas: como Servo e como Rei. Ele construiu e completará a construção de uma casa para Deus, hoje nós somos o tabernáculo (a morada da trindade), mas quando Ele retornar, nossos corpos serão glorificados e prepararemos a terra para que Deus venha tabernacular conosco, para sempre! Jesus vai reinar no trono davídico. Está chegando o dia em que um judeu irá vir do céu, com uma espada, pronto para a batalha, para tomar os reinos da terra, pois é sua herança.

“Disse o SENHOR ao meu Senhor: Assenta-te à minha mão direita, até que ponha os teus inimigos por escabelo dos teus pés. O Senhor enviará o cetro da tua fortaleza desde Sião, dizendo: Domina no meio dos teus inimigos... O Senhor, à tua direita; ferirá os reis no dia da sua ira. Julgará entre as nações; tudo encherá de corpos mortos; esmagará os governantes de todo o mundo.”
(Salmo 110:1-2, 5-6)

Todos os inimigos do povo de Deus são inimigos Dele! Todos aqueles que os tem oprimido, matado, torturado e espalhado o povo de Deus (Israel) pelas nações, durante os séculos vão prestar contas disso, diante do Senhor. Está chegando o dia em que Jesus virá para reinar e ele esmagará todos os governantes corruptos do mundo. Essa é uma descrição a respeito de Jesus que quase não falamos. Outro texto que temos o costume de ler apenas no natal, colocamos em nossas canções apenas a primeira parte do texto, e não percebemos seu significado escatológico e completo a respeito de quem Jesus é:

Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, e o principado está sobre os seus
ombros, e se chamará o seu nome: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade,
Príncipe da Paz. Do aumento deste principado e da paz não haverá fim, sobre o trono de Davi e no seu reino, para o firmar e o fortificar com juízo e com justiça, desde agora e para sempre; o zelo do
SENHOR dos Exércitos fará isto.
 (Isaías 9:6-7)
Eis que vêm dias, diz o Senhor, em que cumprirei a boa palavra que falei à casa de Israel e à
casa de Judá; Naqueles dias e naquele tempo farei brotar a Davi um Renovo de justiça, e ele fará juízo e justiça na terra. Naqueles dias Judá será salvo e Jerusalém habitará seguramente; e este é o nome com o qual Deus a chamará: O Senhor é a nossa justiça.”
(Jeremias 33:14-16)

Toda a criação está gemendo, esperando com expectativa o dia em que será liberta. O reino de Jesus será um reino de justiça, onde todos aqueles que têm fome e sede serão saciados. Essa é a essência do Dia do Senhor, um dia de justiça! Um evangelho que não fala a respeito do Dia do Senhor é incompleto e sem sentido. O Dia do Senhor é dia do acerto de contas de Deus com a humanidade. É maravilhoso lutarmos hoje por justiça – orfanatos, saciando a fome dos famintos, combatendo o tráfico humano, feminicídio, o racismo, o estupro e todo tipo de violação de direitos – mas é inútil fazê-lo sem expectativa no Dia do Senhor. Todos os nossos atos de justiça apontam para a natureza do reino de Jesus e seu retorno.
Então, temos a encarnação, e quem vem anunciar é o mesmo Gabriel que falou com o profeta Daniel a respeito de todas as suas visões, a respeito do Filho do Homem e do fim dos tempos. E nas palavras do anjo há o propósito central da missão do Deus encarnado:

Disse-lhe, então, o anjo: Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus.
E eis que em teu ventre conceberás e darás à luz um filho, e por-lhe-á o nome de Jesus.
Este será grande, e será chamado filho do Altíssimo; e o Senhor Deus lhe dará o trono de
Davi, seu pai; E reinará eternamente na casa de Jacó, e o seu reino não terá fim
(Lucas 1:30-33)

Muitos teólogos afirmam que todas essas passagens não devem ser interpretadas de modo literal, então, por que Deus passou milhares de anos falando a respeito disso? São milhares de anos de tradição judaica a respeito das escrituras, de um reino físico, glorificado e real. A Tanakh ou “Bíblia Judaica” era dividida em três partes (e a maioria dela faz parte da bíblia que temos hoje em mãos): Torah – Lei, Profetas e Ketuvim – Escritos; e em todas essas partes é falado do Messias como Rei. E Jesus confirma toda essa realidade e literalidade em suas falas nos Evangelhos (citando as três partes da Tanakh), os discípulos continuam nessa mesma linha nas cartas. Vejamos duas citações do próprio Cristo:

E Jesus disse-lhes: Em verdade vos digo que vós, que me seguistes, quando, na regeneração, o Filho do homem se assentar no trono da sua glória, também vos assentareis sobre doze tronos, para julga as doze tribos de Israel.
(Mateus 19:28)
E quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com Ele, então se assentará no trono da sua glória; E todas as nações serão reunidas diante dEle, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas; E porá as ovelhas à sua direita, mas os bodes à esquerda. Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo.
(Mateus 25:31-34)

Nos textos de Mateus, Jesus está respondendo a questionamentos dos discípulos a respeito da recompensa em segui-lo e sobre o fim dos tempos. Em seguida temos textos do livro de Atos, a pergunta feita pelos discípulos é a mesma feita há alguns capítulos atrás nos evangelhos. Essa pergunta faz referencia à expectativa que todo judeu tinha do Messias, um Rei militar, que libertaria Israel e governaria toda a terra a partir de Sião. O mais interessante é que Jesus não os repreende dizendo: “Não é bem assim...” ou “Vocês entenderam errado!” A resposta de Jesus é em relação ao tempo! Ainda não é o tempo! A pregação apostólica foi toda respaldada por essa resposta de Jesus.

“Aqueles, pois, que se haviam reunido perguntaram-lhe, dizendo: Senhor, restaurarás tu neste tempo o reino a Israel? E disse-lhes: Não vos pertence saber os tempos ou as estações que o Pai estabeleceu pelo seu próprio poder.”
(Atos 1:6-7)
“[Arrependei-vos] pois, e venham assim os tempos do refrigério pela presença do Senhor, E envie ele a Jesus Cristo, que já dantes vos foi pregado. O qual convém que o céu contenha até aos tempos da restauração de tudo, dos quais Deus falou pela boca de todos os seus santos profetas, desde o princípio
(Atos 3:20-21)

Se já estamos vivendo o reino milenar, como afirmam muitos de nossos irmãos; se não há nada melhor que isso por vir, estamos perdidos! Paulo afirma que tem algo dentro de nós que geme, com grande expectativa esperamos uma realidade melhor que esta. É fato que Jesus está assentado ao lado de Deus; mas o inimigo ainda está governando e oprimindo.

“Mas este, havendo oferecido para sempre um único sacrifício pelos pecados, ESTÁ
ASSENTADO À DESTRA DE DEUS, Daqui em diante esperando ATÉ QUE OS SEUS INIMIGOS SEJAM POSTOS POR ESCABELO DE SEUS PÉS.”
(Hebreus 10:12-13)

Jesus está esperando para cumprir essa promessa! Jesus está ansiando por esse dia, o dia de Sua vingança, de Seu retorno à Terra. O dia ainda não chegou, mas está perto. Ele colocará todos os seus inimigos – os inimigos de Israel e da Igreja – debaixo dos seus pés. A promessa da restauração de todas as coisas, do reino de justiça e paz, como também todas que se referem a Israel ainda não se cumpriram, mas serão cumpridas! Posto que, Deus é poderoso para cumprir todas as suas promessas!

Muitos de nós, se solteiros falamos (pensamos): Eu quero que Jesus volte, mas será que ele pode esperar eu me casar primeiro? Depois disso podemos pensar essa pessoa estará satisfeita e clamará de todo coração Maranata, mas normalmente essa pessoa continuará: Poxa... agora que me casei, Jesus poderia esperar eu ter meus filhos! Todos esses e outros são desejos e sonhos legítimos, mas não podem ser maiores que nosso anseio pelo retorno do Rei!

Deus dos céus ouve os gemidos, Ele sente o clamor da Terra. Hoje no mundo há mais escravos do que em toda a história da humanidade. O tráfico humano e a indústria do sexo movimenta muito dinheiro e escraviza milhares de pessoas. Muitas delas que nunca ouviram falar a respeito de Jesus. Existe um clamor no coração dessas pessoas, toda a natureza está clamando por libertação, pelo retorno de Jesus.

E vi o céu aberto, e eis um cavalo branco; e o que estava assentado sobre ele chama-se Fiel e
Verdadeiro; e julga e peleja com justiça (...) E estava vestido de veste tingida em sangue; e o nome pelo qual se chama é A Palavra de Deus. E seguiam-no os exércitos no céu em cavalos brancos, e vestidos de linho fino, branco e puro. E da sua boca saía uma aguda espada, para ferir com ela as nações; e ele as regerá com vara de ferro; e ele mesmo é o que pisa o lagar do vinho do furor e da ira do Deus Todo-Poderoso. E no manto e na sua coxa tem escrito este nome: Rei dos reis, e Senhor dos senhores.”
(Apocalipse 19:11-16)

Essa é nossa esperança!
Maranata!




[1] Falaremos mais sobre esse texto na próxima postagem.
[2] A palavra  Χριστός (Christos) é mais um título, no hebraico מָשִׁיחַ (Masiah) correspondia a “O Ungido”; para o judeu, era um líder enviado por Deus para libertar Israel e governar a Terra. Cristo no grego significa “encharcado de óleo”. O nome Jesus é o grego de Joshua (Josué) hebraico, que significa: Iaveh é salvação. Seu nome carregava sua missão: o Salvador Ungido, o Salvador que é Rei.

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